sábado, 8 de agosto de 2009

Sobredotados: "O mais importante é ser feliz" mesmo quando se discute a imortalidade da alma antes dos cinco anos

Antes dos cinco anos João Gaspar discutia a imortalidade da alma. Aos 18 entrou na faculdade de psicologia com uma única excepção à regra dos vintes: um 16 a educação física. Hoje prefere sublinhar que "o mais importante é ser feliz", sendo sobredotado ou não.
A ansiedade detectada na escola quando tinha dez anos apresentou-o "por acaso" ao psicólogo Nelson Lima, especialista em sobredotação e coordenador do Instituto da Inteligência.
Os seus pais não deram demasiada importância quando o ouviram falar antes de um ano de idade e também desvalorizaram a necessidade de testar a inteligência, como recomendou logo o psicólogo. A avaliação acabou por ser feita e revelou sobredotação nas áreas da linguística, lógico-matemática e inteligência emocional.
Agora João estuda para ser especialista em sobredotação e "ajudar crianças". O já perito nesta área Nelson Lima sublinha a "tendência geral" dos adultos que foram considerados crianças com "potencialidades acima da média" para obterem "normalmente resultados também considerados de sucesso".
Também há quem cresça e "tenda a diluir-se na multidão", ao optar por "cursos ou profissões com os quais não está totalmente em sintonia", acrescenta.
Aos 14 anos, João decidiu deixar de ir ao Instituto da Inteligência, ao pesar a "estimulação cognitiva" que ali recebia e as "quebras" sentidas quando regressava à escola "normal", onde ninguém sabia das suas capacidades.
As dúvidas na escolha do curso universitário conduziram João novamente a uma psicóloga, que ficou "muito espantada" com os seus níveis de inteligência emocional, já que habitualmente são as mulheres sobredotadas que têm valores acima da média.
A sobredotação chegou a ser avaliada só através do Quociente de Inteligência (QI - superior a 130), mas a evolução das teorias ditam agora que se avaliem traços de personalidade como a liderança e a criatividade.
Estima-se que entre dois a três por cento da população mundial seja sobredotada, o que significa 20 a 40 mil portugueses com capacidades acima da média. "Se cinco mil foram detectados já é um número muito elevado", assume Nelson Lima.
Perante a revelação da sobredotação, a sociedade espera que as crianças sejam "perfeitas" no comportamento e na escola, reconhece.
João Gaspar realça que as crianças sobredotadas recusam reproduzir apenas a matéria, o que faz os professores sentirem-se "ridicularizados, enquanto os alunos sentem que não são estimulados e por isso ficam infelizes e não realizados".
"Eu tive um problema ou outro com algum professor, que parecia adivinhar que eu era um bocadinho diferente. Mas sempre fui muito certinho", diz.
Para que outros sobredotados não sofram, João idealiza uma escola com um currículo obrigatório, com disciplinas extra que realizem os alunos, e que estimule a socialização.
"Todas as pessoas têm capacidades numa determinada área. Connosco é igual, temos uma capacidade de aprendizagem superior. Eu, por exemplo, comecei a andar mais tarde. Ninguém é perfeito", remata.
Nos adultos sobredotados, normalmente não referenciados, Nelson Lima observou casos de "frustração" que se explicam com o "destino e a falta de sorte na escolha da profissão e da empresa". "Não se apercebem que, por vezes, é uma incapacidade para tirar partido de todo o seu potencial", destaca.
"Mesmo aos 30 anos podem recomeçar e essa é uma das grandes satisfações para o psicólogo, ao ser capaz de recuperar uma pessoa para um projecto de vida de maior satisfação consigo própria", frisa. Ou como João resumiria: "Ser feliz."

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