sábado, 8 de agosto de 2009

Compra de trabalhos não é crime ... sem comentários científicos

O negócio em torno da compra e venda de teses e trabalhos académicos "revela grande imoralidade e uma enorme falta de ética e deontologia", mas não constitui crime algum, garante Costa Andrade, penalista e professor catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.
É seguramente um ilícito disciplinar que deve ser severamente punido pelas instituições porque representa uma violação gravíssima dos valores fundamentais do espírito académico. Contudo, do ponto de vista legal não vejo nenhuma norma que se possa aplicar", diz. Isto porque é o próprio autor do trabalho que decide vendê-lo, abdicando, assim, dos seus direitos sobre a obra. Já quem compra para apresentar como sua uma tese feita por outro comete uma "fraude académica", mas esta figura não está, no entanto, prevista na legislação. "Actualmente, os valores académicos não estão criminalmente protegidos, mas é natural que venham a sê-lo se este tipo de práticas aumentar", considera o especialista.
O caso muda de figura se a tese ou o trabalho for plagiado. Aí já é crime e pode ser punido com pena de prisão até três anos. Mas, apesar de os professores não terem dúvidas de que o plágio acontece com frequência, só três casos estão a ser julgados em tribunal. Foram denunciados pela Universidade do Minho, Universidade de Coimbra e Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa (UL).
Costa Andrade defende que o plágio deve ser participado ao Ministério Público, mas ele próprio não fez a denúncia quando apanhou uma aluna em flagrante. "Convidaram-me para integrar o júri de um mestrado e quando li a tese reconheci imediatamente páginas inteiras. Tinham sido escritas por mim! Era tudo, palavra por palavra, retirado de um livro meu. Sem aspas, sem nada", conta. A tese foi imediatamente chumbada, mas o professor está convencido de que o plágio nunca teria sido descoberto se ele não integrasse o júri. "Com a massificação do ensino superior e da produção científica, torna-se impossível controlar", explica.
Jorge Ramos do Ó, professor da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da UL, tem outra opinião. Garante que é difícil haver fraude se os orientadores fizerem um trabalho individualizado com os alunos. "Só que muitos professores têm dezenas de orientandos e não têm tempo para fazer a orientação como deve ser", diz. Por isso, a fraude acaba por também pôr em causa os docentes. O que pode explicar a 'condescendência' com que alguns casos são tratados, quando descobertos. "Às vezes, os casos são abafados", revela Sara (nome fictício), que também anuncia na Net a venda de trabalhos académicos e o "apoio" à elaboração de teses.

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